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Individuação: O Mito Junguiano para a nossa época, Por James Hollis
Abaixo, trecho do capitulo 5 do livro "A passagem do meio" de James Hollis.
A Experiência da passagem do meio não é diferente de acordar e descobrir que estamos sozinhos, balançando num navio, sem nenhum porto à vista. Nossas únicas opções são voltar a dormir, pular do navio ou agarrar o leme e seguir viagem.
No momento da decisão, a grande aventura da alma nunca está mais clara. Ao agarrarmos o leme, assumimos a responsabilidade pela jornada, por mais assustadora que ela possa ser, por mais solitária ou injusta que possa parecer. Quando não agarramos o leme, permanecemos presos na primeira idade adulta, presos nas aversões neuróticas que constituem nossa personalidade atuante e, por conseguinte, a separação de nós mesmos (...)
Jung escreve em sua auto biografia:
"Vi frequentemente as pessoas ficarem neuróticas quando se contentam com respostas inadequadas ou erradas às questões da vida. Elas buscam posição, casamento, reputação, sucesso exterior ou dinheiro, e permanecem infelizes e neuróticas mesmo quando conseguem o que estavam procurando. Essas pessoas estão geralmente confinadas dentro de um horizonte espiritual estreito. Sua vida não possui conteúdo suficiente, significado suficiente. Quando lhes permitido se desenvolver e adquirir uma personalidade mais ampla, a neurose geralmente desaparece"
A ideia de Jung é fundamental, pois todos nós vivemos uma vida comprimida dentro dos estreitos limites da nossa época, lugar e história pessoal. Para vivermos uma vida mais abundante, somos obrigados a compreender os limites dentro dos quais fomos criados. A premissa implícita da nossa cultura, ou seja, que seríamos felizes através do nosso materialismo, no narcisismo, ou do hedonismo, foi claramente a falência. Aqueles que abraçaram esses valores não estão nem felizes nem completos. Não precisamos de "verdades" não examinadas e sim de um novo mito vivo, ou seja, uma estrutura de valor que oriente as energias da alma de forma condizente com a nossa natureza. Embora frequentemente seja útil remexer nos fragmentos do passado em busca de imagens que nos falem como indivíduos, raramente é possível abraçar as mitologias de outro tempo e lugar. Somos obrigados a descobrir a nossa.
A necessidade de encontramos nosso caminho é óbvia, mais importantes obstáculos se colocam no caminho. Reexaminemos por um instante os sintomas que caracterizam a transição da meia-idade. São eles o tédio, a repetição, mudança de emprego ou de parceiro, o uso de drogas ou álcool, pensamentos ou atos autodestrutivos, infidelidade, depressão, ansiedade e crescente compulsividade. Por trás desses sintomas existem duas verdades fundamentais. A primeira é que há uma enorme força que vem de baixo. Sua urgência é sentida como destruidora, e causa ansiedade quando reconhecida e depressão quando reprimida. A segunda verdade fundamental é que os antigos padrões que conservaram afastada essa urgência interior se repetem com crescente ansiedade, porém com cada vez menos eficácia. Mudar de emprego ou de parceiro não muda a maneira como nos sentimos em relação a nós mesmos com o decorrer do tempo. Quando a crescente pressão interior se torna cada vez mais difícil de ser contida pelas antigas estratégias, uma crise de individualidade explode. Não sabemos quem somos, realmente, além dos papeis sociais e dos reflexos psíquicos. E não sabemos o que fazer para reduzir a pressão.
Esses sintomas anunciam a necessidade de uma mudança substantiva na vida da pessoa. O sofrimento acelera a consciência e, a partir de uma nova consciência, uma nova vida pode surgir. A tarefa é assustadora, pois precisamos primeiro reconhecer que não existe salvação, nem pais que fazem tudo melhor e nenhuma maneira de voltar a uma época anterior. O Si-mesmo tentou crescer exaurindo as desgastadas estratégias do ego. A estrutura do ego que nos esforçamos tanto para criar se revela agora insignificante, assustada e sem respostas. Na meia-idade, o Si-mesmo conduz o conjunto do ego a uma crise a fim de realizar uma correção no curso.
Debaixo dos sintomas que caracterizam a passagem do meio está a suposição de que seremos salvos encontrando e nos ligando a alguém ou a algo no mundo exterior. Para o bem do marujo de meia-idade que está afundando, não existem esses preservadores de vida. Estamos no vagalhão da alma, certamente junto com muitas outras pessoas, mas precisamos nadar com nossas próprias forças. A verdade é simplesmente que aquilo que devemos saber virá de dentro de nós. Se pudermos alinhar a nossa vida com essa verdade, não importa quão difíceis os desgastes do mundo, sentiremos um efeito benéfico, esperança e vida nova. A experiência do início da infância, e posteriormente da nossa cultura, nos alienou de nós mesmos. Só podemos retomar nosso curso restabelecendo a ligação com a nossa verdade interior (...)
"Se trouxeres à tona o que está dentro de ti, o que está dentro de ti te salvará. Se não trouxeres à tona o que está dentro de ti, o que não trouxeres à tona te destruirá."
Elaine Pagels, The Gnostic Gospels, p.152
(...) O conceito de individuação representa o mito de Jung para a nossa época no sentido de conjunto de imagens que guiam as energias da alma. Simplesmente descrita, a individuação é a imposição evolutiva de cada um de nós de nos tornarmos a nós mesmos o mais completamente que formos capazes, dentro dos limites que nos são impostos pela nossa sina. Mais uma vez, a não ser que enfrentemos conscientemente nossa sina, ficaremos presos a ela. Precisamos separar quem somos daquilo que adquirimos, nosso senso de eu de facto porém falso. "Eu não sou o que me aconteceu, eu sou o que escolhi tornar-me". Precisamos dizer conscientemente essa frase todos os dias para que possamos nos tornar mais do que prisioneiros da nossa sina. (...)
(...) Desse modo, a preocupação com a individuação não é narcisista; é a melhor maneira de servir à sociedade e apoiar a individuação de outras pessoas. O mundo não é servido por aqueles que se alienam de si mesmos e dos outros. A individuação, como conjunto de imagens orientadoras que constituem ao mesmo tempo a meta e o processo, é útil à pessoa que, por sua vez, contribui para a cultura. "o essencial é importante apenas como ideia" escreve Jung, "o essencial é a opus que conduz à meta; essa é a meta de toda uma vida"
Quando agarramos o leme no convés do capitão, mal conhecemos o nosso rumo, sabendo apenas que a coisa precisa ser feita, vivemos a grande aventura da alma. No final das contas, é a única jornada que vale a pena empreender. A tarefa da primeira metade da vida é fortalecermos suficientemente o ego para deixamos nossos pais e ingressarmos no mundo. Essa força torna-se disponível na segunda metade para a mais ampla jornada da alma. O eixo então se desloca do sentido ego-mundo para o ego Si-mesmo e o mistério da vida desabrocha de maneiras sempre renovadas. Não se trata de uma negação da nossa realidade social e sim de um restabelecimento do caráter essencialmente religioso de nossa vida. Por conseguinte, Jung sugeriu que precisamos indagar de uma pessoa
"Se ela está ou não ligada a algo infinito. Está é a poderosa pergunta da sua vida... Se compreendermos e sentirmos que nessa vida já temos um vinculo com o infinito, nossos desejos e nossas atitudes sofrem uma transformação. Numa análise final, só valemos alguma coisa por causa do essencial que personificamos, se se não personificamos isso, a vida será desperdiçada"
Memories, Dreams, reflections, p.325.
A capacidade de enfrentar, num relacionamento, aquilo que é maior que o nosso ego significa ser enformado e transformado por isso. (...) Precisamos nos conhecer mais plenamente e nos conhecer no contexto do mistério maior.
Conheça o livro clicando aqui.
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